Quando o delegado Florisvaldo Nery da Cruz chegou à pacata Piripá, no Sudoeste baiano, em maio de 2006, ele pensava em fazer amigos e realizar o trabalho com apoio da sociedade civil e do Governo do Estado.
contudo, mais de dez anos se passaram e ele, hoje com 64 anos, virou para boa parte dos 12 mil moradores da cidade ‘persona non grata’, alguém que muitos querem longe do cargo que ocupa.
Nomeado em 2003, o delegado Florisvaldo passou a atuar em Piripá em maio de 2006 depois de comandar as delegacias de Cordeiros e Guajeru, ambas no Sudoeste, e com pouco mais de 8 mil habitantes cada uma.
Ele mesmo quem pediu transferência, pois achava, na época, que era melhor atuar em uma unidade da Polícia Civil vinculada à 10ª Coordenadoria de Polícia do Interior (Coorpin), sediada em Vitória da Conquista, como é a de Piripá.
“A delegacia de Guajeru é vinculada à 20ª Coorpin, de Brumado, e ao menos na época era muito desestruturada, funcionava em local improvisado, era uma casa alugada. Já a Corpin de Vitória da Conquista é outra coisa, bem melhor”, comentou.
Logo ao chegar em Piripá, o delegado Florisvaldo conta que passou a investigar supostos atos de corrupção do então prefeito Jeová Barbosa, que já foi condenado pela Justiça Federal por fraudes diversas na administração pública local.
Jeová não foi localizado para comentar sobre a relação dele com o delegado, que atribui a pessoas ligadas ao ex-prefeito, e ao atual grupo político que comanda a cidade, um protesto que destruiu a delegacia na madrugada de terça-feira (31).
30 armas roubadas
Na ação, um grupo de cerca de 50 pessoas invadiu a sede da delegacia e, além de destruí-la, incendiaram dois veículos estacionados na porta e roubaram, segundo o delegado, mais de 30 armas e cerca de 100 motos apreendidas que estavam nos fundos da delegacia.
As armas são revólveres e espingardas, algumas de calibre 12, de acordo com Florisvaldo, que é acusado de não estar realizando investigações criminais. Ele nega, diz que o protesto é político e que só não trabalha mais porque o Governo da Bahia não dá infraestrutura – na delegacia de Piripá só tem ele de policial.
Inquérito aberto
A Polícia Civil, em Salvador, informou que já foi aberto inquérito para investigar a destruição da delegacia e identificar os autores do crime.
O prédio da delegacia local pertence à Prefeitura de Piripá. De estrutura da Polícia Civil, tinha apenas aparelho de fax, computador, impressora, linha telefônica e uma viatura que não foi danificada.
Dois dias depois do ocorrido, o que se vê nas paredes da delegacia são frases como “fora delegado”, “delegado Florisvaldo quer arruinar a cidade” e outras que afirmam que o policial “apoia bandido e ladrão”. Escritos semelhantes também estão em muros e lojas do comércio no Centro da cidade.
Na boca do povo
Semana passada, uma manifestação contra o delegado reuniu cerca de 1.500 pessoas, segundo estimativas da Prefeitura de Piripá. Eles levavam faixas de protestos diversas, como “Fora delegado, o povo piripaense não te aguenta mais”.
Apesar da reclamação da falta de segurança, nas estatísticas da Secretaria de Segurança Pública (SSP) a cidade de Piripá quase não possui registros de violência – no entanto, segundo a população, muito desse resultado tem a ver com as constantes negativas do delegado em registrar as ocorrências.
Disponíveis ao público, os dados seguem uma quantidade de notificações semelhantes a de cidades do porte de Piripá.
No município, em 2014, houve um homicídio doloso, um estupro e cinco roubos/furtos de veículos; no ano seguinte, apenas um homicídio doloso e dois furtos de veículos; em 2016, uma pessoa foi assassinada, tentaram matar outra e os casos de furto a veículos subiram para nove. Este ano, segundo a SSP, não foram registradas ocorrências.
Quatro remoções
O delegado já foi removido do cargo quatro vezes (em 2007, 2013, 2014 e 2015), sendo transferido para outra cidade, porém, conseguiu reverter a situação na Justiça em 2016, após conseguir liminar (decisão temporária).
Em favor dele, o delegado tem o Ministério Público do Estado (MP-BA), autor, em 2014, de uma ação civil pública contra o Governo da Bahia, julgada procedente em 2015. A ação determina, dentre outras coisas, que o Estado forneça estrutura de pessoal e material para que o delegado possa exercer as funções.
Fonte: Correio